O estudo das religiões passa por diversos processos e requisitos necessários que podemos ter como referência o nosso próprio processo de aprendizagem na escola secular. Muitos alunos me procuram para perguntar como estudar as religiões, seja para simplesmente conhecer ou para fazerem seus trabalhos na faculdade. Nesse texto, dou algumas dicas, que utilizo na prática nesses anos de estudo e ensino a respeito de religiões, pois percebi que há diferentes maneiras de realizar esta tarefa.
Alexandre Cumino no livro “Médium: Incorporação não é possessão”, destaca a necessidade de esvaziar o copo para poder aprender coisas novas a fim de não misturar ou criar “pré-conceitos” e comparações. De fato, esta é uma orientação bem pertinente se considerarmos que no campo das religiões o envolvimento emocional da pessoa é uma condição implícita no estudo. Entretanto, para estudar uma religião eu preciso impreterivelmente ter um envolvimento emocional com ela? Não necessariamente! Ainda mais quando alguém está pesquisando ou estudando as religiões com a intenção de escolher uma para se aprofundar e praticar.
No entanto esvaziar o copo pode ser um impedimento quando se deseja estudar para comparar ou buscando equivalências, sendo esse um método adotado por alguns pesquisadores da área de ciências humanas. Nota-se que comparar não é supervalorizar ou inferiorizar, mas considerar o OUTRO diferente, equiparando-o na sua especificidade.
Para o antropólogo francês Pierre Sanchis há três atitudes fundamentais quando se refere ao desejo de conhecer o OUTRO, ou seja, outra sociedade, cultura e no nosso caso, outra religião. A primeira diz respeito a não desqualificar a outra religião em detrimento do que já conheço, seja de outras religiões, ou de experiências anteriores. Algumas pessoas, por terem tido uma única experiência anterior não muito positiva em determinada instituição, tomam-na como referência e passam a desconsiderar tudo de novo que possam vir a aprender sobre a mesma.
A segunda diz respeito ao grau de estranhamento que o OUTRO causa, seja em alguma prática ou perspectiva e devido a essa reação, o sujeito fica na defensiva de tal maneira que não se permite aprofundar nos estudos. E finalmente a terceira atitude diz respeito aos questionamentos provocados em mim a partir das experiências que tive com o OUTRO.
Então estudar as religiões requer “ação” na medida em que necessito me deslocar, sentar, levantar, agachar, bater almas e principalmente sentir.
Se considerarmos as religiões como expressões culturais, conforme defende o antropólogo americano Clifford Geertz, devemos considerar a perspectiva comparada, um importante recurso no estudo das religiões. Aplicando semelhante sistemática, a socióloga Leila Marrach realizou um estudo comparando o passe espírita e o johrei praticado pela Igreja Messiânica Mundial e apresenta alguns pontos bem interessantes em seu texto. (Veja o texto aqui)
Então, no campo de estudo das religiões é preciso ter espírito de busca e questionar tudo que é apresentado, pois não estamos olhando com olhos de religiosos que dá fé em tudo, mas olhamos como pesquisador e como o curioso que não está absolutamente absorto das verdades contidas nos textos sagrados.
Outro requisito necessário no estudo das religiões, principalmente, é deixar no passado as pseudoverdades apreendidas, pois elas são uma perspectiva do todo. Não estou recomendando esquecer, apagar ou sobrepor as informações obtidas, mas simplesmente deixá-las lá. Afinal, o conhecimento adquirido a partir de agora precisa de espaço, então começar do zero é solicitado.
Aprender sobre religiões requer mais que uma postura mental diferente, requer ação. Enfatizo sempre a pesquisa de campo, ou seja, as visitas físicas às religiões como um recurso para melhor compreender e sentir. É muito diferente ler sobre uma religião, pois estamos olhando a partir dos olhos do pesquisador em contrapartida com meu próprio olhar. Como descrever a sensação do passe do caboclo, as meditações com mantras budistas ou a efervescência do orar em línguas no templo neopentecostal? De fato, não há como descrever, pois não há nada melhor do que sentir.