Eu gosto muito de pensar, talvez tivesse cursado filosofia em uma outra situação de vida, entretanto pensar é um prazer para mim, mas que em alguns momentos se torna uma tortura, afinal, com o pensamento vem o discernimento e a crítica. Crítica, ao contrário do que é pregado pelo conhecimento popular, não é uma inferiorização ou um juízo negativo sobre algo. A crítica é um exercício de julgamento? Sim, mas por ponderação. Pode ser que a crítica seja algo positivo, criticar é analisar algo e definir as suas impressões sobre isso. Percebam que disse “as suas impressões”, ou seja, não é uma regra universal e pode até ser percebida de uma outra maneira por alguns. Eu por exemplo adoro coentro, mas tem gente que odeia, são dois tipos de críticas opostas.
O pensamento crítico é fundamental para o exercício da intelectualidade e para você evitar ser pego em situações contrárias à sua vontade. Exercer o pensamento crítico é dominar a si mesmo e poder definir se algo que se ouve é exatamente como deve ser ouvido ou se estão tentando te ludibriar.
O cenário religioso é um terreno fértil para pessoas que gostam de se aproveitar da fragilidade alheia. Claro, que em muitos casos, as pessoas generalizam tudo, como o caso do “dinheiro” na religião. Não vejo como negativo você dar dinheiro para seu terreiro, para comprar os itens da sua oferenda, para pagar o pai de santo que irá fazer isso, afinal ele está dispondo de tempo, de vitalidade, de conhecimento e de axé para te atender. Entretanto, sabemos que tem gente que “inventa” um problema para vender uma solução. O problema é que as soluções são bem temporárias e sempre fica sendo necessário acrescentar um “anexo” ao contrato principal. Óbvio que existem casos em que realmente é preciso fazer mais de um trabalho ou reforçar trabalhos, mas nem sempre é assim, então devemos ser bem claros e transparentes quando isso ocorrer.
Seja como for, o que queria trazer nesse texto é que a Umbanda como conhecemos está morta, como já disse em outros artigo neste blog, entretanto o perigo agora é a Quimbanda, que parece caminhar para o mesmo rumo. Veja bem, eu não sou contrário a manifestação múltipla da religiosidade e da magia, mas sou crítico daqueles que oferecem um “supletivo” para que a pessoa alcance a maestria de forma inadequada, despreparada, só para ter um título a ser exposto nas redes sociais, pois se trata disso, títulos e visibilidade nas redes. Pense comigo, se uma pessoa adentrou agora a Quimbanda, como ela pode se tornar mestre da arte se ela ainda está conhecendo o terreno que está pisando? Ela nem afinou direito o instrumento mediúnico, não estreitou os laços com Exu após a iniciação – que muda muito – não conseguiu ainda nem sequer fazer trabalhos para si, como ela vai começar a cuidar dos outros? Você já viu alguém formado na Universidade que não tenha feito o ensino fundamental?
A não ser que ele seja uma pessoa superdotada e quando falamos disto dentro do cenário religioso ele tem que ser um ENVIADO, um AVATAR de uma divindade para isso acontecer. Mas você conhece algum Avatar? São poucos na história, então por que agora abundam tantos escolhidos?
Outra questão que é preponderante é o comportamento sacerdotal, que não está atrelado a aspectos moralistas, mas a conceitos de compreensão do universo e da comunidade. Quando nos tornamos um Kimbanda, partimos do pressuposto que estamos nos tornando curadores. Algumas curas podem ser feitas a base da força, outras devem ser usadas de demanda para acabar com a fonte de emanação negativa, mas sempre tudo é pautado no equilíbrio cósmico. Quando você caminha para o sacerdócio do Nganga, o Kimbanda que recebeu mais outorgas para atender terceiros, ele deve no mínimo ter controle da sua própria vida, ter feito contato com seus próprios Espíritos, saber como conduzir uma ritualística e um aconselhamento para quem irá procurá-lo. Mas, além disto, ele deve ter um comportamento adequado com o cargo sacerdotal, nunca usando do sacerdócio para fins puramente egoístas. Você deve se perguntar agora: “Mas a Quimbanda não é o caminho do egoísmo?”. Sim, egoísmo no sentido de se pensar em si, antes de pensar no outro, mas sabendo que como sacerdote você deverá atender seus clientes da melhor forma possível.
Certa vez uma pessoa me disse que queria aprender magias de amor para acabar com relacionamentos, pois ela não acreditava no sistema vigente de casamentos monogâmicos. Inclusive queria acabar com casamentos que tinham filhos e que o casal era feliz, baseado na sua ideia de mundo, que uma das pessoas do casal não queria aquela vida (sem que a pessoa lhe tivesse dito nada). De fato, esse “feiticeiro” tinha atração sexual por uma das partes desse casal e queria se refastelar com essa pessoa de forma sexual apenas, sem envolvimentos sentimentais ou familiares. Oras, não há nada de errado em usar de magia para conseguir sexo, porém há algo errado quando você quer “quebrar” uma família, causando sofrimento a um casal e a crianças por simples prazer carnal, ou não?
O mestre de Quimbanda, vulgarmente chamado de Tata ou Mameto, deve ser também um mestre da vida e mestres não se curvam a desejos escravizadores. Tudo aquilo que se torna algo que domina a sua vida: sexo, comida, drogas, prazeres mundanos, preguiça, cobiça exacerbada, inveja etc., tudo isso é sentimento escravizador e um mestre não pode ser escravo de nada. Muitos usam discursos de “liberdades”, mas para justificarem libertinagens e desassossegos de suas almas. Essa pessoa que cito, procurou quem lhe desse isso e se tornou do dia para a noite um mestre… porém um mestre que tem outro mestre, seus comportamentos compulsivos.
Existe esse caminho da feitiçaria, onde a destruição se torna o foco de tudo, ele é o caminho do Ndoki ou do Muloji, aquele que pratica puramente os feitiços maléficos, sem cunho de cura. Ele se torna um opositor do Kimbanda, que é um curador. Porém, o tipo de trabalho também traz alguns ônus para a vida da pessoa, com o tempo ela é drenada, vampirizada e sucumbe a suas próprias trevas interiores, ao contrário do Kimbanda que aprende a abraçar suas trevas e a absorvê-la em equilíbrio eterno, como no exemplo do TAO, onde o Yin carrega uma centelha do Yang e o Yang carrega uma centelha do Yin e eles se tornam opostos complementares, sempre buscando o equilíbrio.
Hoje, o que importa é o Título comprado, como dos antigos barões brasileiros, assim como a relevância que se dará nas redes sociais, pois com visibilidade, poderá exercer seu fascínio nas mentes fracas de seus seguidores para que ele tenha benefícios pessoais, seja ele sexo, dinheiro ou apenas o prazer da fama.
Cuidado, pois você é o responsável por cair nessas armadilhas e só você é capaz de sair dela.