Muitos acabam por dizer que eu faço oposição a Umbanda Sagrada (US), então não posso utilizar dos conceitos dessa vertente. Bom, primeiramente eu não faço oposição a nenhuma vertente, apenas defendo que a Umbanda é multifacetada e que a verdade não está em apenas um lugar. Que não devemos assumir que apenas essa vertente é correta e as outras são insanidades ou primitivas. Eu defendo a Umbanda que pratico: tradicional. Mas tenho que concordar que alguns termos cunhados e utilizados pela US são extremamente úteis ao explicar sobre a teologia umbandista. Um deles é o termo denominado fator.
Apesar do termo fator estar presente e ligado diretamente a US e aos Tronos Divinos (Duplas de Orixás polarizados), não podemos afirmar que seja uma criação da própria US, apenas uma releitura do que os antigos já falavam ao se referirem aos Domínios e aos Atributos dos Orixás.
Os Orixás são definidos através das suas atuações, pelo domínio que possuem na natureza e pelos seus poderes. Essas atribuições ou atributos são geralmente explicados através de lendas e o Orixá pode possuir diversos atributos que teoricamente não são compatíveis, como a dualidade de Exu por exemplo. Visto isso, entendemos como tem tantas pessoas tentando enquadrar os Orixás na Árvore da Vida e não conseguem uma formatação 100% redonda.
As coisas ainda ficam mais complexas quando falamos de Orixás de Umbanda, pois os mesmos não são os Orixás Africanos ancestrais, encantados da terra africana. São, na realidade, os encantados de terras brasileiras, que já existiam por aqui e que acabaram por assumir certa identidade e nome com o sincretismo. A gente percebe isso ao começar a vasculhar as inúmeras religiões e os cultos que haviam aqui em época pré-descobrimento e desde que houve a mistura entre as raças. Um ótimo livro para saber sobre isso é o Encantaria Brasileira – O Livro dos Mestres, Caboclos e Encantados, organizado por Reginaldo Prandi.
Retornando aos fatores vemos que são uma forma de exprimir as ações que aquele Orixá está “capacitado” a realizar. Lembrando que os Orixás podem executar o que melhor lhes aprouver, se você pedir saúde para Oxóssi ou para Obaluayê (Omulu) irá funcionar, porém a forma como funcionará será diferente. Seguindo a teologia da US, Oxóssi trará o conhecimento necessário para curar aquele mal que lhe aflige, Obaluayê irá depurar e transmutar a situação negativa que acarretou a doença e Omulu poderá paralisar o processo negativo que gerou a mesma. Compreendem que é apenas a forma de atuação que muda?
Mas e na Umbanda Tradicional (UT), que não possui essa ideia de fatores e Tronos Divinos, inclusive não cultua até certos Orixás (Logunan, Oro Iná, etc.) como acontece? Dá mesma forma!
Na realidade nunca ficou bem explicado esses encaixes que foram colocados dentro dos Tronos Divinos e só quem poderia explicar a sua lógica era o Sacerdote Rubens Saraceni. Mas é mais provável que sejam empréstimos de nomenclatura para designar forças que atuam sobre outros nomes conhecidos ou até mesmo adaptados. Veja só, Oxóssi mesmo dentro da Umbanda Tradicional absorveu as atribuições antes dadas a Ossaim, logo podemos ver esse fenômeno ocorrer em várias outras culturas. Na Umbanda Esotérica do Pai Matta e Silva, podemos perceber isso também com a designação das caboclas Oxum, Nanã e Iansã dentro da linha de Iemanjá. Na Umbanda Tradicional cultuamos essas três entidades como Orixás e não como caboclas, mas tanto em uma quanto na outra vertente a sua ação será a mesma, seus atributos os mesmos.
Ocorre muito de confundirem Linhas de Umbanda com os Orixás de Umbanda, nem todos os Orixás regem linhas. Isso não quer dizer que eles não atuem na Umbanda, mas quer dizer que apenas não encabeçam a chefia das Sete Linhas de Umbanda. Na Casa que frequento mesmo, cultuamos as Sete Linhas e não há nela uma chefia para Oxum, porém Oxum é a padroeira da Casa e uma das Orixás mais importantes nos trabalhos que desenvolvemos.
Então podemos dizer que domínios, regências, fatores e atributos acabam sendo a mesma coisa ou algo muito similar. A diferença é que os fatores são nitidamente expressados como verbos de atuação.
Dentro da US temos a seguinte configuração:
Oxalá | Fator Congregador | Logunan | Fator Cristalizador |
Oxum | Fator Agregador | Oxumaré | Fator Renovador |
Oxóssi | Fator Expansor | Obá | Fator Concentrador |
Ogum | Fator Ordenador | Iansã | Fator Direcionador |
Xangô | Fator Equilibrador | Oroiná | Fator Purificador |
Obaluayê | Fator Transmutador | Nanã Burukê | Fator Decantador |
Iemanjá | Fator Gerador | Omulu | Fator Paralisador |
Já na Umbanda Tradicional teríamos algo mais ou menos assim:
Oxalá | Fé, Crença, Religiosidade, Pureza, Amor Divino |
Ogum | Lei, Ordem, Proteção, Abertura de Caminhos |
Oxóssi | Conhecimento, Cura, Abundância, Prosperidade |
Xangô | Justiça, Equilíbrio, Razão, Firmeza e Acabar com Inimizades |
Iansã | Movimento, Direção, Encaminhamento, Resgate de Eguns |
Iemanjá | Limpeza, Regeneração, Geração, Criação, Vida e Concepção |
Omulu | Cura, Doença, Evolução, Transformação, Progressão, Destruição, Decantação e Paralisação |
Oxum | Amor, União, Prosperidade, Sensualidade e Feminilidade |
Nanã Burukê | Sabedoria, Maturidade, Decantação e Aconselhamento |
Ibejis | Inícios, Começos, Inocência, Alegria, Cura |
Por que é importante conhecer sobre esses domínios? Pois assim você, independente da vertente praticada, consegue compreender a ação das forças dos Orixás e porque devemos chamar (evocar) alguns e não outros para determinados assuntos. Além de poder compreender as influências energéticas que são aplicadas nas cores, velas, ervas, fitas, incensos e etc. O porque a vibração de Oxalá é mais intensa no branco e não no preto, entre tantas outras coisas.
Tudo trabalhará dentro da egrégora que está inserida, então se na sua egrégora o correto é acender vela vermelha pra Ogum, ela funcionará, assim como funcionará se acender vela azul pro mesmo Orixá, em uma casa que o cultue dessa forma. Até mesmo se acender vela verde, rosa, amarela, etc…
Retomando ao início do texto, podemos perceber que apesar da US ter uma teologia própria, foi influenciada pelas teologias anteriores a ela, por isso que digo que não podemos invalidar o antigo para aceitar o novo. É preciso uma confluência de pensamentos em prol da Umbanda, sem preocupar-se com a vertente, mantendo sempre o aconselhamento: Se você está feliz aonde está, continue lá!
A Verdade não está em um só lugar e talvez nem esteja acessível a nós do plano material, portanto toda e qualquer atitude radical só produzirá energias nocivas e inércia mental. Vamos ampliar a forma de pensar e usar o nosso discernimento. Não aceite algo que não lhe parece coerente e também não descarte algo pois você não teve ainda a compreensão necessária para absorver. Seja ponderado e racional.