Muitos questionam o uso das terminologias da demonologia moderna em alguns cultos dados como satanistas, luciferianos e até mesmo na Quimbanda. Dizem que usar nomes dessas entidades, supostamente, negativas e malignas é uma afronta ao Deus único israelita.

Contudo, em novas evidências arqueológicas, sugerem que nem o próprio deus israelita é o verdadeiro DEUS e que ele foi uma construção baseada em um deus do deserto, que monopolizou o culto de um povo, que acabou resistindo ao tempo.

O deus israelita e por consequência judaico-cristão é conhecido pelo tetragrama YHVH, que pode ser lido de certa forma como Yahweh, Javé ou Jeová. As pesquisas mais recentes nos dizem que Yahweh vivia em uma sociedade e um contexto politeísta, em outras palavras, estaria em meio a diversos deuses e divindades.

Existem evidências disto em um termo encontrado no começo da bíblia (antigo testamento) que fala sobre Elohim. Segundo alguns estudiosos este termo seria um plural da palavra El. Podemos perceber referencias deste termo sendo usado em diversas passagens bíblicas como em gênesis 35:2

Jacó disse à sua família e à sua gente: “Tirai do meio de vós os deuses estrangeiros (elohim), purificai-vos e mudai vossos vestidos.”

Se Deus era único, quem seriam esses deuses estrangeiros, lembrando que essa é uma tradução e que o melhor seria olhar as versões mais fiéis, assim como o texto hebraico. Mas encontraremos essa referência com o sentido de divindades em Êxodo 18:11, Jó 1:6, Salomão 8:5) e em outros locais.

As evidências sugerem até mesmo que Yahweh era cultuado ao lado de sua consorte, outra divindade, a deusa Asherah. Essa deusa sucumbe ante a presença do patriarcado judaico e da onipresença de Yahweh como deus único.

O interessante é olhar como a FORMA patriarcal é importante para o povo hebreu e posteriormente para o Judeu, sendo que toda transmissão ocorre no ramo masculino, por meio de Adão, posteriormente vemos o grande patriarca sendo Abrão, que gera Isaac, que por sua vez gerou Jacó e Judá (e os demais irmãos que dão origem as 13 tribos hebraicas), que muito a frente os descendentes irão gerar Arão, Davi, Salomão, e assim por diante.

Os nomes de grande importância que temos na Bíblia sempre evidenciam mais o masculino, partindo de Adão, passando por Noé, Abraão, Isaac, Jacó, Moisés, Davi, Salomão, até chegar em Jesus (dentro da mitologia cristã já).

O EMBATE COM OS OUTROS DEUSES

Existe uma ideia de que Yahweh em um processo de embate, disputa a primazia e a popularidade com o Deus mesopotâmio Baal, chegando até mesmo a sincretizá-lo em sua figura. A constituição do monoteísmo começa a ocorrer em torno do século V A.E.C.

Neste processo há uma deturpação das divindades dos outros povos, colocando que todas as divindades que não Yahweh seria divindades malignas ou inferiores. Alguns estudiosos apontam que há até mesmo a absorção e ressignificação da divindade Cananéia El que tem seu lugar usurpado por Yahweh. Curiosamente El é o termo empregado para designar um dos muitos nomes de Deus e um sufixo de grande parte da corte angelical, como Rafa-EL, Mikha-EL, Uri-EL, Gabri-EL e assim por diante. Os nomes dos anjos, que designam suas funções e que possivelmente não são de origem hebraica, usam do sufixo El para se referir a Deus, então RAFA-EL seria em uma tradução aproximada “A Cura de Deus”.

Com a ênfase em Yahweh, qualquer outra divindade seria suprimida e sufocada, principalmente as entidades femininas que seriam demonizadas. No trabalho de conclusão de curso de Ana Luísa Alves Cordeiro, ASHERAH: A Deusa Proibida, encontramos diversas evidências sobre o processo de influência do sincretismo das divindades e da sua absorção em culto popular ou até mesmo formal.

Ana Luísa destaca que o pesquisador Haroldo Reimer atribuí cinco fases para um desenvolvimento do monoteísmo de Israel. A primeira fase sendo a absorção de El por Yahweh, sendo que El era tido como o pai dos demais deuses e o criador da terra, algo que veremos ser um dos atributos atribuídos ao Deus Hebraico, posteriormente.

Após essa fase, temos o embate contra um dos deuses mais populares da região mesopotâmica que era Baal, um dos filhos de El, associando-o a fertilidade. Yahweh, nos textos bíblicos promete uma descendência grande e longínqua para Abraão, onde seus descendentes se espalhariam por toda a terra.

As demais fases baseiam-se na adoração exclusiva de Yahweh, com a destruição de ídolos (principalmente os serpentinos) e os elementos dos demais deuses.

Desta forma percebemos que o deus único é uma construção social e teológica e não uma REALIDADE única e cósmica.

Esse mesmo Deus se mostra ressentido, invejoso e muitas vezes cruel em várias passagens do Velho Testamento, colocando cidades inteiras ao chão por caprichos e até mesmo no livro de Jó, disputando com o Opositor a sua “adoração” perante ao pobre Jó, que tem tudo usurpado de si, para divertimento de Deus e do Opositor.

OS DEMÔNIOS NOSSOS DE TODOS OS DIAS

Como visto, fica claro a campanha difamatória atribuída aos deuses de outras regiões e culturas, demonizando-os e inferiorizando-os perante o poder de Yahweh. Então, todos os deuses de todas as culturas seriam falsos deuses, demônios que se passavam por Deus para que seus fiéis fossem ludibriados.

Dentre esses demônios destacamos Belzebut, um dos maiorais da Quimbanda, que tem origens bem interessantes na figura do deus cananeu Baal. Essa divindade ocupou um espaço de destaque no culto de diversos povos da mesopotâmia, tais como fenícios e cartaginenses. Também associado a uma deidade solar, fazendo frente aos demais deuses do Sol, como Hélio, Apolo, Rá, Hórus e até mesmo o próprio Jesus cristão.

Porém, dentre os domínios mais empreendidos nos poderes de Baal estava a sua capacidade fértil, o que pelo qual podemos associar a sua figura dentro da Quimbanda como um Bode ou um híbrido, lembrando que a fertilidade sempre esteve associada a esses animais com cascos e chifres, tais como o próprio deus Pã ou até mesmo o Deus Cornífero de diversas culturas celtas.

A má fama se dá quando dentro da pesquisa histórica é atribuído o sacrifício de crianças ao deus da fertilidade, contudo, precisamos compreender as coisas de forma a não soar anacrônico. Várias culturas em diversas partes do mundo praticavam o sacrifício humano, inclusive o próprio patriarca hebreu Abraão foi chamado aos montes para sacrificar seu único filho Isaac para a glória de Yahweh.

Sua demonização começa ocorrer primeiro com a associação de Baal (que também pode ser um título, como senhor) ao deus das pestes e das moscas Zebub. Então temos a figura do Baalzebub formada, que posteriormente pela transliteração se torna o SENHOR DAS MOSCAS.

Tido atualmente, pelo cristianismo e todas as seitas mágicas que bebem da mitologia judaico-cristã, um dos sete príncipes infernais.

Dentro da trindade maioral¹ – Lúcifer, Belzebut e Astaroth – temos que Belzebu habita a África e comanda todos os espíritos de lá.

A intenção aqui é demonstrar como as divindades de outros povos se ressignificam e chegam até nós totalmente deturpadas de sua essência e como que elas também ganham novas roupagens, exatamente como a Quimbanda fez com a demonolatria baseada no Grimorium Verum.

Antes de concluirmos e deixarmos todo o ranço que nos é imbuído desde crianças tomar conta, devemos analisar friamente a história e as culturas, vendo que o próprio Deus bondoso que hoje aceitamos por meio da mitologia judaico-cristã não é o VERDADEIRO DEUS e tampouco é tão bondoso.

DEUS, DEUSES E MAIS DIVINDADES

O entendimento que temos desse deus YAHWEH é o que chamamos de demiurgo. Demiurgo é um conceito tomado do platonismo pelo gnosticismo e que implica dizer que o deus que constrói as coisas não é o verdadeiro CRIADOR, mas uma divindade atribuída, próxima e que possivelmente é uma entidade maligna.

O DEUS CRIADOR real seria inatingível, o Deus inefável, que se distancia de toda criação por não poder fazer parte dela, pois ele mesmo a criou. Desta forma, ele estaria distante das nossas mazelas, mas teria incumbido diversas divindades de fazê-lo.

Segundo alguns satanistas o demiurgo se envaideceu de suas conquistas e assumiu que acima dele não havia ninguém mais poderoso e em sua vaidade ocupa o espaço do verdadeiro Deus inefável.

Na visão Banto e na visão Iorubá, assim como na Tupi, encontramos essa divindade muito distante da humanidade, responsável por tudo que existe, mas que não pertence a ela e que de certa forma manifesta-se por meio de outras divindades e suas individualizações. A esse deus maior os bantos dão o nome de Zambi, os Iorubás de Olodumaré e os Tupis de Yamandu ou Nhanderuvuçú.

Os manifestantes do poder do Deus Maior viriam expresso pelos Inquice, Orixás e Deuses Nativos do povo Original, além dos ancestrais divinizados.

Em um esforço agora de pensamento podemos dizer que o próprio Yahweh era uma dessas manifestações, mas que em sua arrogância e prepotência ele desqualifica todos os demais deuses e ocupa o espaço que deveria ser dado ao grande Deus Inefável.

Se Lúcifer fez uma revolta no céu, provavelmente foi por isso!²


1 Falaremos em outro artigo sobre isto.

2 Essa é uma licença poética do autor.


Sugestão de leituras:


Saiba mais sobre os Exus na Umbanda e Quimbanda.

 

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