O trabalho no terreiro é caritativo e preza pelos valores da Umbanda: Simplicidade, Humildade e Caridade. Justamente por isso esperamos que os médiuns sejam orientados por esses mesmos princípios. Contudo isso nem sempre ocorre. Por que? Simples, os médiuns são os maiores doentes dentro desse pronto-socorro chamado Umbanda.
Não importa a casa ou terreiro que se frequente, fatidicamente nós iremos nos deparar com médiuns que desrespeitam as regras das casas, que manifestam-se de forma espalhafatosa, incluem diversos elementos teatrais¹ dentro da liturgia e do ritual e pior, acabam se afastando ou afastando seus guias e mentores. Esse médium geralmente começa a se sentir melhor do que os demais e acaba criando uma ruptura energética na corrente, colocando todos em perigo, sujeitos a obsessões complexas e ataques negativos dos adversários e da corrente negativa que quer ver todos os trabalhos de Umbanda e religiões que prezam pela melhora do ser humano, sendo exterminados.
Pareço um tanto quanto dramático? Na verdade, em forma de discurso pode parecer, mas isso não tira a veracidade dessas minhas palavras. Chamo muito esse tipo de médium de SHOWMAN, pois ele não está se preocupando com os seus consulentes, pior, está preocupado em aparecer e demonstrar sua grande capacidade mediúnica e o poder de suas entidades.
Esse tipo de médium, geralmente possui mesmo mediunidade ostensiva e tem entidades que trabalham bem, pelo menos no começo. Porém, devido aos resultados de suas entidades, acaba por se envaidecer e passa a frente das entidades nas consultas. O que no começo pode não parecer grave, passa a ser, quando as consultas não acontecem mais com o guia-espiritual, mas com o médium se passando – consciente ou inconscientemente – pelo guia. A isso damos o nome de mistificação mediúnica.
Podemos notar que esse médium começa a perder o respeito pela hierarquia da casa, chegando (incorporando) em momentos não oportunos e deixando-se levar, sendo o último a desincorporar. Faz isso por que? Para que haja uma plateia maior vendo suas peripécias incorporado. O que antes podia passar despercebido, pois as demais entidades e médiuns estavam trabalhando e os filhos estavam envolvidos em suas próprias consultas e dores, se torna diferente, passando todos a prestar atenção a única entidade ainda incorporada.
Pela hierarquia de uma casa de Umbanda, o primeiro a incorporar deve ser sempre o Dirigente Espiritual, sendo que esse também é o último a desincorporar. Só há exceção a essa regra, quando se tratam de pais e mães pequenos, com a permissão dos dirigentes ou por meio de pontos de chamada das entidades dos pais e mães pequenos, executados pelos dirigentes. Os médiuns que ainda não ocupam posto na hierarquia – independente do seu tempo de casa – devem respeitar as regras e a própria hierarquia.
Podemos também notar vários sintomas nesse médium – em desequilíbrio – além de não respeitar a ordem de “chegada e de subida”. Podemos notar que geralmente ele traz sua própria consulência, ou seja, seus seguidores, escolhendo assim quem irá atender. Desta forma cria uma clientela cativa, que estará acostumada com seu jeito e também criará um impedimento desses consulentes despertarem ao passarem com outras entidades, notando que há algo em desequilíbrio com aquele médium showman.
Ao fazer esse tipo de atendimento preferencial, podemos criar uma situação de preterição dentro da casa, os consulentes que não passam com aquele médium, começam a se sentir deixados de lado ou inferiores ao que tem clientes cativos. Além disto, pode ocorrer na cabeça do leigo ou iniciante que se as pessoas sempre voltam para passar com o mesmo médium/entidade, que ele seja extremamente eficiente nos seus trabalhos e por isso começam a almejar passar com ele também. Percebam que é uma auto-alimentação de vaidades, partindo do médium e atingindo o consulente e voltando a nutrir o médium.
Essa atitude é tão nociva, que pode gerar uma perda de credibilidade para os demais médiuns e entidades. Pois com o tempo, mesmo que um consulente passe com uma entidade regular, logo será tentada a ir passar com a entidade do showman. O problema é quando a consulta é feita de forma aleatória, mediante senhas, então o consulente passa em uma consulta com uma entidade que não queria e depois espera a oportunidade para passar com a outra entidade, do showman. Compreendem como isso enfraquece a corrente e gera perda de confiança dos demais?
Suponhamos que o médium, corretamente incorporado, indica uma determinada mironga ou dá determinado conselho de forma assertiva para um consulente X e esse mesmo não “QUER OUVIR A VERDADE” e passa com o médium showman que lhe dirá tudo ao inverso. Qual conselho você acha que a pessoa seguirá?
Ademais, esses médiuns showman começam a criar artifícios para se destacarem dos demais, aumentando o número de paramentos usados, itens, além de exagerarem nos trejeitos, nas danças, nos gritos, nos gestuais, etc. Começam a se julgar melhores, chegam atrasados nas giras, não vão em giras de desenvolvimento pois não acreditam que precisam aprimorar sua mediunidade, faltam nas giras de estudos, pois “já sabem tudo” e só aparecem nas giras que tem plateia.
O que de fato incomoda todos é que esse médium sempre tem incorporações chamativas. Ele gira, ele pula, ele dança, ele canta, ele xinga, ele anda por todo congá, ele começa a fazer gracejo com os demais. Fora quando dá para fazer consulta, descarrego, transporte, mironga e ainda incorporar outras 10 entidades na mesma consulta. Claro! Ele não precisa de mais ninguém. Esse médium é tão poderoso que é auto-suficiente. Logo isso gera aquela consternação em quem compreende o que ocorre por detrás da cortina do Congá de que há exagero em suas atitudes.
Incorpora um obsessor num descarrego e depois fica 10, 15, 20 minutos largado no chão, sem respiração, sem conseguir falar, arfando, rosnando, sem conseguir se levantar, etc. Será que fica mesmo? Não seria isso apenas uma simulação para mostrar como ele/ela trabalhou?! Esses médiuns sempre “sofrem” ao desincorporar, nunca retornam totalmente íntegros. Pior, ainda se dizem inconscientes… Vamos jogar a culpa na mediunidade.
Além dos sintomas claros de desequilíbrio ditos acima, pode-se também avaliar essa conduta por meio da fala da entidade. Sempre consultas rasas, contrárias aos preceitos de Umbanda, com pagas de retorno e vingança, esquecendo-se do caráter evangelizador das consultas de terreiro. Podemos perceber também na forma personificada, onde o médium, traído pelo seu inconsciente, acaba misturando o EU do guia com o EU da pessoa. Quando se refere a um fato do “cavalo”, mas diz EU. Oras! Mas é a entidade ou o guia que tá ali? Oras, parte 2, não era essa pessoa inconsciente? Logo não incorreria nesse equívoco.
Então, um conselho a todos que procuram as casas de Umbanda para o conforto religioso. Evitem os médiuns que gostam de aparecer. O preto-velho que fica quietinho tem muito mais “mironga” do que aquele que sai pulando pelos cantos no terreiro. Só um alerta, para depois não reclamarem que a gente não avisa.
1 A teatralidade faz parte também do ritual de Umbanda, mas de forma exagerada poderá prejudicar todo o ritual.
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