Práticas Naturais, indução ao consumismo e ética de mercado.
Estava passando por uma avenida perto de casa e com o trânsito parado de São Paulo, acabei ficando em frente a um ponto comercial, que agora havia se tornado uma farmácia de manipulação. Enquanto estava tudo parado comecei a olhar para as placas e pôsteres falando sobre os fármacos naturais, homeopáticos e etc., então reparei que havia um desses cartazes dizendo: Manipulamos Florais de Bach.
Achei aquilo legal, pois estava parado mesmo no trânsito, o local é relativamente perto de casa e acabo passando sempre por lá e seria um local bom para mandar manipular meus florais e dos meus clientes. Estacionei o carro em frente à farmácia e desci, logo fui atendido e perguntei:
– Vocês têm florais?
A atendente solícita respondeu-me que sim e me mostrou um display em uma vitrine com vários frascos na cor âmbar, no formato de florais de tratamento, com o logo da BioFlorais. Eu interpelei-a e disse que não eram aqueles que eu queria. Disse-lhe que queria florais de Bach, se eles os possuíam em formato STOCK1 ou se eles manipulavam em frascos tratamentos2, então a minha surpresa:
– Mas esses são florais de Bach e não possuímos outros, nem stock ou frasco tratamento. Tentei ser simpático com a moça, mas estava muito BEECH3 nesse dia, logo precisava me controlar, então disse:
– Não minha senhora, esses são florais, mas não os de Bach. Ademais, na placa lá na frente diz que vocês manipulam florais de Bach, mas esses não são de Bach e nem são manipulados, já vieram prontos, industrializados.
Ela deu de ombros e disse que eram os únicos e eu me virei e fui embora.
Esse episódio abriu minha mente para uma coisa: As farmácias não estão preparadas para os terapeutas florais e nem para os naturopatas!
Precisamos mudar isto, de forma urgente, antes que cause uma extrema complicação para nossa classe de trabalho. Além da desinformação da atendente, creio eu que há uma campanha de desinformação proposital por parte dessas “indústrias”. Não estou aqui para julgar a eficácia de outros sistemas florais, mas usar um determinado nome de sistema floral e vender outro é antiético e até mesmo perigoso.
Veja só, o floral RESCUE4 é extremamente recomendado pelo terapeuta floral para todos os momentos de necessidade e emergência. Se eu for a um terapeuta floral (practitioner) que trabalha com o sistema Bach e ele me recomendar um RESCUE e eu acabar caindo em uma dessas farmácias, vou ser induzido – supostamente como leigo – de que são iguais. O BioFlorais tem até um composto que se chama Rescue SOS. Nomes muito similares e que podem confundir até o mais atento dos clientes.
Vejamos a composição abaixo tanto do floral RESCUE do sistema Bach, quanto do floral RESCUE SOS do sistema BioFlorais:
Floral de Bach Rescue: | Floral BioFlorais RESCUE SOS: |
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Como podemos perceber eles são completamente diferentes, tanto na escolha e nas espécies de flores, quanto na quantidade de flores contidas dentro do frasco. Isso sem contar os conservantes. No sistema Bach usa-se o Brandy e no sistema BioFlorais encontrei no frasco que possui, além das flores: ácido ascórbico (vitamina C), Benzoato de Sódio, Sorbitol, Água e Álcool 96 GL 3%.
O Benzoato de Sódio é um conservante alimentar, bactericida e fungicida que só é efetivo em meio ácido (pH < 3.6). A água tem um pH de 7 quando neutra, porém a água de torneira varia entre 7 e 4 e a água de purificadores varia entre 5 e 4, se tornando ácidas.
Além disto, há indícios de que a associação de Benzoato de Sódio e Ácido Ascórbico tem potencial carcinogênico, como podemos ver em diversas pesquisas. Abaixo reproduzo a pesquisa de Larissa Morais Guilhermino e de Alice A. da Matta, do Centro de Pós-Graduação Oswaldo Cruz, intitulada ESTUDO DA FORMAÇÃO DE BENZENO EM BEBIDAS CONTENDO O CONSERVANTE BENZOATO DE SÓDIO:
“Resumo: Sob determinadas condições, a combinação de ácido benzóico e ácido ascórbico (vitamina C) podem formar benzeno em bebidas, como refrigerantes e sucos industrializados. Esta contaminação é questão de saúde pública e tem causado significativos protestos entre os defensores do ambiente e saúde, por o benzeno ser uma substância carcinogênica. Como a Organização Mundial de Saúde e autoridades sanitárias estrangeiras e nacionais não estabeleceram um limite de benzeno para bebidas industrializadas, deve-se considerar o limite utilizado para água potável. O benzeno resulta da descarboxilação do conservante ácido benzóico na presença de ácido ascórbico, principalmente sob ação da luz e calor. O International Council of Beverages Associations publicou diretrizes para ajudar a minimizar ou eliminar a formação de benzeno em bebidas.
Efeitos no organismo: O benzeno possui potencial para gerar radical oxigênio livre, o que explica várias de suas ações tóxicas. A principal ação tóxica, em exposição aguda, é a depressão do SNC, enquanto que em exposições crônicas, destaca-se a ação mielotóxica, comprometendo a série que se origina no eritroblasto. Quando se instala a pancitopenia pode ocorrer a aplasia medular, com infiltração gordurosa e necrose da medula. Essas alterações hematológicas aparecem meses ou anos após exposição ocupacional (OGA, 2003). Os principais efeitos são: Mielotóxicos, que causam depressão das células progenitoras primitivas e indiferenciadas, lesão do tecido da medula óssea, formação clonal de células primitivas afetadas decorrentes de danos cromossômicos dessas células. Esta ação está associada ao aparecimento de trombocitopenia (com bloqueio de megacariócito), leucopenia (com maior frequência granulopênica) e anemia aplástica. Essas alterações são dependentes de fatores individuais, intensidade e duração da exposição; Imunotóxicos, os que estão relacionados aos efeitos na medula óssea que provocam alterações na imunidade humoral e celular; e carcinogênico devido ao fato do benzeno ser um agente leucemogênico para o ser humano, na maioria dos casos relacionada à exposição industrial (MILITÃO; RAFAELI, 2011; OGA, 2003). Estudos epidemiológicos mostram que a exposição crônica e elevadas concentrações benzênicas pode desencadear episódios de leucemia. O tipo de leucemia associada ao benzol é a mielogênica aguda (MILITÃO; RAFAELI, 2011). A hematoxicidade do benzeno é mediada por um número de hidroxilados e metabólitos de cadeia aberta, entretanto os eventos celulares e bioquímicos que desenvolvem a anemia aplástica e leucemia mielóide não estão esclarecidos. O conhecimento atual sobre os processos carcinogênicos sugere que o desenvolvimento da leucemia, dependente do benzeno, resulta de múltiplos eventos citotóxicos, genéticos e epigenéticos independentes. Alguns estudos indicam que metabólitos do tipo quinônicos (catecol e hidroquinol) seriam os compostos responsáveis pela ação mielotóxica do benzeno, ao reagirem com os cromossomos resultam em alterações morfológicas e interferências na mitose. As espécies de oxigênio reativas, geradas durante as etapas de oxidação dos metabólitos poliidroxilados às quinonas, contribuem com a toxicidade do benzeno, uma vez que estudos relatam aumento nos níveis de DNA oxidado a 8-hidroxidesoziguanosina em células da medula óssea expostas ao benzeno. No Brasil, a ação cancerígena do benzeno foi reconhecida oficialmente a partir de 1994, pela Portaria SSST nº 3, de março de 1994. A capacidade do benzeno causar danos cromossômicos e na medula óssea já foi amplamente demonstrada em humanos e animais (OGA, 2003).”
Por se tratar de um “remédio” já me estranha que seja permitido pela vigilância sanitária à associação de Ácido Ascórbico e de Benzoato de Sódio. Se no refrigerante já é algo preocupante, quando não é preocupante estar em um composto para promoção da saúde integral? Dentro da maioria das terapias florais o único conservante utilizado é o Brandy (tradicionalmente), vinagre de maçã ou glicerina.
Evidencia-se então várias complicações como a não-garantia de segurança do composto, aliada com a indução dos atendentes – que não são adequadamente treinados – a relacionar os vários sistemas florais como um só, a confusão gerada pela similaridade dos nomes e até mesmo a pouca penetração de temas como esses na grande mídia como rádio e TV.
Não quero que meu cliente seja ludibriado e muito menos um filho meu. Logo não compreendo como podemos agir em um caso assim sem sequer uma representatividade, uma associação de terapeutas naturais – NATUROPATAS, adequada e em conformidade com as práticas e também em contato com o mundo real.
Defender a terapia natural virtualmente é apenas o início, mas é muito confortável. Precisamos de vozes para ir ao embate, principalmente para esclarecer a população da eficácia e segurança das práticas hoje chamadas Integrativas e Complementares. Com a inclusão de diversas terapias Integrativas dentro do Sistema Único de Saúde, podemos nos deparar com um caso similar a esse que expus aqui. Um paciente do SUS indo a uma farmácia e comprando um floral de outro sistema, acreditando que se trata do sistema Bach.
Reitero que não estou aqui questionando a eficácia dos sistemas, mas questionando a orientação dada aos clientes e pacientes. O floral que indiquei para tratar determinada questão, pode ter um nome similar em outro sistema floral, mas tratar de uma situação totalmente antagônica.
Deixo meu alerta e recomendo que antes de adquirirem qualquer produto verifiquem as credenciais tanto do terapeuta que o indicou, como da farmácia e também do produto. Quando estamos lidando com a saúde de um ser humano, não há espaço para ACHISMOS, “ESQUIZOTERISMOS” e ESTRELISMOS.
1 Versão Stock é o um frasco de 10ml contendo apenas Brandy associado a Essencial Floral de Bach específica. Seria a versão concentrada da essência floral.
2 Frasco tratamento é um frasco preparado com conservante, geralmente Brandy, e com um composto de essências florais, além de água neutra.
3 Beech é uma das essências florais propostas pelo Dr. Edward Bach que trataria de questões de intolerância.
4 Rescue Remedy Floral para situações de emergência do sistema floral Bach.