A palavra original do Tupi é muyrakytãs e designa um artefato utilizado pelos índios brasileiros, especialmente os da região do Amazonas, em volta do pescoço como colar. É um amuleto de cunho tanto religioso, quanto mágico. A palavra pode ter diversas traduções, mas devido ao seu formato geralmente lembrar um sapo, acredito que a melhor tradução é mu’ir+ki+itã (enfeite, usar, uma espécie de rã ou sapo).
Geralmente esses amuletos são esculpidos em pedras, principalmente verdes ou madeira. Esses amuletos eram encontrados principalmente entre uma tribo de mulheres guerreiras conhecidas como Icamiabas. São essas índias guerreiras que foram confundidas com as amazonas gregas e que acabaram por dar o nome a região e a floresta amazônica. Essas índias tinham mais semelhanças com os mitos gregos – reforçando o esforço do inconsciente mitológico coletivo – dentre estes, a festa feita para a deusa Yacy ou Jaci, que é a deusa da lua. Podemos até traçar paralelos com as virgens de Diana ou Ártemis, na mitologia greco-romana. Havia um rito de fecundidade que ocorria uma vez ao ano, no local chamado Serra da Lua (Yacy-Taperê), onde elas a margem do lago sagrado Yacy-Uaruá (Espelho da Lua), fazia a festa em comemoração a sua deusa, dormindo com índios da tribo dos Guacaris. Após o coito, elas mergulhavam nas águas do lago e traziam consigo a matéria-prima para confeccionar o artefato ou muiraquitãs. Vejam as relações entre a rã ou sapo, o culto a lua e o empoderamento feminino. Algumas lendas dizem que esses amuletos eram dados de recordação aos índios Guacaris, para lembrarem-se das índias que haviam deixado para trás.
Os Muiraquitãs eram utilizados tanto nas tranças dos cabelos, envoltos ao corpo e até mesmo com o tradicional colar. Acredita-se que ele tenha propriedades curativas para todos os males físicos e espirituais, além de trazer sorte e felicidade.
Câmara Cascudo conta no Dicionário de Folclore Brasileira a seguinte lenda:
“Era noite de lua cheia! Na tribo indígena havia um rebuliço entre as jovens! Elas conheciam a força dos muiraquitãs, as pedras verdes que davam poder aos guerreiros, seus escolhidos. Elas sabiam que em toda noite de lua cheia a Iara surgia do fundo das águas do Amazonas, numa renda de espumas, trazendo nas mãos misteriosas as almejadas pedras verdes, os muiraquitãs. Abandonando a taba, as índias de cabelos luzidios penetraram na floresta. As águas escuras do Amazonas, como um espelho negro, refletiam a lua branca. Escondidas entre as folhas grandes e os troncos rugosos, elas aguardaram silenciosas a aparição da Rainha das Águas. A Lua chegou ao meio do firmamento. Um silêncio profundo pairou no ar. De repente, um murmúrio de águas se fez ouvir. As índias sentiam palpitar no peito o coração esperançoso.
A Iara surgiu. Olhou a Lua e sorriu. A Lua parecia estática. Era o encontro entre a Rainha das Águas e a Rainha do Firmamento! Os cabelos verdes e limosos cobriam o corpo da Iara. Levantando a mão para o céu, pareceu fazer uma prece. Num movimento rápido, lançou as pedras no espaço e mergulhou sob a chuva de muiraquitãs, de diferentes formas, cada qual representando um animal das selvas. Era esse o momento esperado. As índias mergulharam nas águas e espalharam no leito de areias brancas as prendas cobiçadas. A luz da Lua, refletindo-se nas pedras, tornava-as visíveis. Regressaram felizes, levando as pedras para ofertar aos guerreiros por elas escolhidos. As qualidades do animal que o muiraquitã reproduzia passavam ao seu portador.”
Algo que sempre intrigou é o fato dos amuletos serem feitos de pedras verdes semelhante ao Jade, de origem asiática. Porém, não se encontraram jazidas (segundo o dicionário) desse mineral na América.
A mitologia nativa brasileira é fantástica e cheia de detalhes, mas infelizmente está desaparecendo dando lugar a outras culturas estrangeiras. É importante manter essa memória viva, veja que não devemos para nenhuma outra cultura, além de conhecer a mitologia local e entender como os nativos (e como nós mesmos) encaravam a vida e as suas lendas.