Desenvolver a mediunidade é muito mais do que simplesmente ir até o terreiro e deixar-se levar, cedendo o corpo para as entidades que lá se manifestam.

Muitas pessoas confundem desenvolvimento mediúnico com incorporação pura e simples. Entendam, não há como simplesmente ir e chacoalhar o corpo no terreiro, isso não é engrandecedor e qualquer um pode fazer isso, ou melhor, pode achar que está fazendo isso.

Parte do desenvolvimento mediúnico se dá também com o estudo pautado no bom-senso, que irá ser o direcionador dos trabalhos espirituais que serão desenvolvidos. Primeiramente devemos compreender que não importa só achar que está fazendo algo, mas é preciso realmente entender o que se passa, até aquele algo ocorrer. Como comparação, durante o ensino médio não nos importa como os átomos se comportam em uma reação nuclear, só nos importa calcular sua massa atômica e como eles reagem através das fórmulas. Porém, se nos propormos a fazer uma faculdade em Física, devemos saber como isso ocorre e todas as situações por detrás do mesmo, além de não se deixar levar por ilusões ou convicções inabaláveis.

Nos cursos de desenvolvimento mediúnico, prioriza-se muito a estrutura padronizada e quase não se dá a atenção ao desenvolvimento humano, ao desenvolvimento emocional e ao desenvolvimento moral do postulante a médium. Cada médium é um ser independente, com suas próprias incertezas e com seus próprios receios. Além disto, cada um precisa de uma lição diferente, que sempre vem com a mediunidade, não podendo receber instruções enlatadas.

Além desse completo desinteresse dos “sacerdotes” pelos seus filhos-de-fé, contamos ainda com o despreparo dos mesmos para compreender como desenvolver seus discípulos. Como foram geralmente formados nesse mesmo padrão, acabam passando para frente a estrutura que aprenderam, mas que não ajuda todos. Chegam, inclusive, a se esquecer de pilares básicos da Umbanda, como o tema desse artigo: A Coroa Mediúnica.

Os postulantes a médiuns, que podemos facilmente chamar de cadetes, devido à proximidade da Umbanda com um sistema hierárquico militar, são expostos a giras fechadas, com a promessa de que desenvolverão sua mediunidade e incorporarão seus guias e alguns todos os guias que forem evocados. Contudo isso não é verdadeiro, de fato é até perigoso.

Quando temos a missão de sermos médiuns – ostensivos e ativos – carregamos certa estrutura psíquica e espiritual diferenciada, preparada para o contato com o mundo astral. Além disto, contamos com uma carga maior de fluído nervoso (ectoplasma) para as manifestações. Isso não nos faz melhores, apenas mais adaptados para o trabalho que será realizado, porém isso é como uma ferramenta, o seu bom uso depende do usuário e não da ferramenta.

Uma das primeiras considerações aqui é que nem todos somos médiuns de incorporação, logo não adianta forçar uma incorporação que a mesma não ocorrerá. Outro dia, respondendo a um leitor, comentei sobre isso e o mesmo me indagou:

“Mas todos lá no terreiro acabam incorporando os guias que são chamados! Eu vejo isso ocorrendo, como você pode me dizer que isso não acontece?”

Respondo: Nem sempre o que vemos é a verdade, o véu de Isis é muito denso em alguns casos e para algumas pessoas. Elas não conseguem se livrar da ilusão e da necessidade de acreditar que são diferentes ou melhores, pois é isso que acham que um médium é! Alguém melhor que os outros. Isso é uma tremenda ilusão, na realidade os médiuns tem muito mais a dever do que quem não possui uma mediunidade ativa.

Com isso quero dizer que algumas pessoas simplesmente ACHAM que estão incorporando, são hipnotizadas para acreditar nisso e outras são manipuladas para tal. Alguns até mesmo não incorporam nada e nem sequer tem uma manifestação mediúnica, mas agem com trejeitos de caboclos e pretos-velhos em um teatro sem fim. A isso damos o nome de mistificação, que pode ser consciente ou mesmo inconsciente.

No desenvolvimento mediúnico, é analisado se primeiramente existe a mediunidade e depois tenta-se achar qual é o tipo de mediunidade que o postulante possui. Logo que foi definida procede-se com os trabalhos, procurando sempre o Evangelho de Cristo, como bússola moral, para guiar as manifestações mediúnicas a princípio (e durante toda a vivência mediúnica de fato!).

Após compreendermos isso, temos outro porém: a chamada Coroa Mediúnica. Coroa é o termo usado para definir aquilo que vem acima de nossa cabeça, o Ori ou chakra Coronário. Há uma falsa informação de que possuímos todos os guias em nossa coroa, ou seja, a nossa disposição. Que basta apenas que os evoquemos – através de cânticos, chamados e até mesmo pontos cantados – para que os mesmos venham ao nosso socorro e ao trabalho. Isso é em partes real, porque realmente podemos evocar qualquer espírito que quisermos, porém isso é muito mais real no Espiritismo, onde o trabalho é de conhecimento, de pesquisa e de experimentação. Então, cabe facilmente o fato de evocar um espírito para lhe fazer perguntas e aumentar o conhecimento acerca de alguma ciência ou assunto. Porém, nem sempre quem nos atende é o espírito que chamamos, muitas vezes é um espírito simpático, pois o espírito que chamamos pode, entre outras coisas, estar ocupado, estar reencarnado ou até mesmo estar em trevas e preso. Conseguem perceber onde quero chegar?

Já a Umbanda tem uma característica de socorro, de auxílio e de ajuda. É um grande hospital, agindo ora como pronto-socorro e ora como clínica para tratamentos mais longos. Então, não podemos chamar um espírito, que não tenha conhecimento algum, para auxiliar uma pessoa. O auxílio deve ser feito com especialistas, com espíritos preparados para tal e em nossa humilde opinião, quem somos nós para identificar tal? Por isso que a Coroa mediúnica é formada antes da nossa encarnação.

Primeiramente nos é definido (de fato escolhemos conjuntamente) um Espírito que tomará a função de Chefe-de-Coroa, que será o Espírito responsável pela nossa mediunidade e de tudo aquilo que faremos com ela. Esse espírito é quem toma conta da nossa cabeça e permite outros guias a se manifestarem. Então, o médium Everaldo tem um Guia-de-Coroa chamado Caboclo Pena Branca, porém naquele dia de trabalho, será chamada as linhas de pretos-velhos. O Preto-Velho Pai João pede permissão para o Caboclo Pena Branca para se manifestar no seu pupilo e assim é feito. O mesmo ocorre em um processo de obsessão espiritual, mesmo que seja difícil ou duro ver isso. A obsessão só se instala quando nós estamos em desequilíbrio ou negativados, se não houve merecimento, não há obsessão. Mas todos nós somos devedores e temos falhas a serem resgatadas, logo acaba por muitas vezes se instalando obsessões em nossa vida. Pior é que como médium há um canal aberto, o seu chefe-de-coroa, que é um Espírito Evoluído e esclarecido irá permitir que o obsessor atue, pois você está vibrando na frequência dele e deve aprender uma lição com isso. É meio rude? Pode até ser, mas é assim que as coisas são.

Ainda no nosso exemplo, o Pai João não estava lá passeando e falou:

“Opa! Hoje tem gira ali e tem aquele médium, vou lá usar ele como instrumento!”

Não é assim que acontece. O Pai João já fazia parte da sua coroa mediúnica, ou seja, do exército (ou time) de espíritos que são escolhidos para servirem mediunicamente através daquele médium. Mas isso não implica em ter TODOS guias de TODAS as linhas em nossa coroa. Geralmente possuímos um Caboclos e um Pretos-Velhos, mas nem todos possuem Baianos, Boiadeiros, Marinheiros, Crianças e até mesmo Exus e Pombagiras.

Tem gente que diz que podemos chamar caboclos de todas as linhas, mesmo que esses não façam parte da nossa coroa. Olha, poder até pode… Mas que trabalho será executado assim tão forçosamente? Não é melhor trabalhar com algo que já estamos familiarizados? Porque nesse caso o que importa é o resultado, ou seja, o auxílio a ser prestado.

Então, nosso médium Everaldo possui um Caboclo Pena Branca na coroa, mas não tem um Caboclo Peito de Aço. Porém em um gira de Ogum, o sacerdote desinformado começa a chamar o Peito de Aço e obriga todos a incorporá-lo. Isso não é saudável, pois é um guia que não está acostumado a trabalhar com aqueles médiuns e irá necessitar (caso realmente incorpore) de mais fluído nervoso (ectoplasma) para manifestar-se. Porém nem todos conseguem ter esse tônus extra. Em minha concepção, respeitar a coroa mediúnica é mais importante do que saber o nome e os pontos dos guias. É extremamente prioritário saber quem são seus guias e entender que não é preciso ter todos os guias na sua coroa se manifestando. Que os guias que estão comprometidos com você, são mais que suficiente para executar todas as obras que são necessárias dentro do seu mediunato.

Pode ser que você incorpore dez vezes o Caboclo Pena Branca e apenas uma o Pai João. Pode ser que vários guias se revezem nos trabalhos caritativos de atendimento e pode ser que você nem sequer tenha muitos guias, mas o que importa não é a quantidade, não é? O que realmente importa é a qualidade. Então, se livre desses pensamentos padronizados e pasteurizados. Precisamos entender cada médium como um ser humano em desenvolvimento, além da mediunidade.

 

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