Nos textos anteriores pudemos notar que o Japão foi um país sempre muito apegado as suas tradições como forma de preservar a identidade cultural e a memória de seus habitantes. As mudanças provocadas no âmbito político, econômico e social, originadas por interesses internos, vieram acompanhadas de uma gama infindável de adaptações no modo de vida nipônico. O período de transição do feudalismo para o capitalismo introduzido pelo imperador Meiji, provocou também uma rápida expansão no campo cultural.
Novas técnicas gráficas facilitaram aos japoneses o acesso a textos ocidentais e as primeiras traduções para o japonês de obras clássicas de outros povos. Ciência e arte ganharam um novo impulso e o sistema educacional se esforçou para tornar a alfabetização um ato universal. Porém, os primeiros choques culturais se iniciaram juntamente com a orientação sincrética na vida religiosa, que propiciou o surgimento das “novas religiões”. Costuma-se usar este termo (Novas Religiões Japonesas – NRJ) devido à comparação com as religiões tradicionais (Xintoísmo e Budismo) lá estabelecidas. Nota-se que essas religiões, fruto das adaptações surgidas a partir das tradições, proporcionavam uma nova visão de mundo como também ajudavam as pessoas a suportar situações de pressão emocional. Além disso, por meio das práticas religiosas, os adeptos podiam experimentar uma fuga da realidade sofrida e acreditavam veementemente na intervenção do sobrenatural em sua vida atual.
Alguns estudiosos entendem que esse é um período muito significativo no Japão, pois considera-se que houve um surto messiânico-milenarista coletivo. Ora, se o país estava passando por modernizações, como podemos encarar este fato como algo negativo? Nota-se que a maioria da população trabalhava em atividades artesanais, cuja força de trabalho era requerida. Com a modernização por meio da inserção de máquinas, a figura do artesão foi substituída pelo operário que trabalhava em condições muito precárias e uma jornada de trabalha exaustiva.
Semelhantemente ao que ocorreu na Europa na época da Revolução Industrial, o Japão experimentou um progresso a passos largos e portanto exigiu de seus habitantes uma postura aberta diante a modernidade. Contudo o arquipélago não importou somente tecnologia, mas também cultura, adotando hábitos, costumes ocidentais assim como alimentos e porque não o idioma. Hoje o inglês é o segundo idioma no Japão e uma série de palavras japonesas caiu em desuso sendo substituídas pelo idioma britânico. Há um alfabeto nipônico, o katakana, que é utilizado exclusivamente para escrever palavras estrangeiras, o que seria uma forma de identificar o que é Made in Japan e o que não é.
Retomando então o campo das religiões, e sendo elas uma expressão cultural, obviamente que sofreriam mudanças também. Ilustrando então a mistura de culturas e influências religiosas na vida cotidiana, as novas religiões apresentam uma transformação significativa como:
- forte distinção das religiões estabelecidas (Xintoísmo, Budismo, Cristianismo) e apoio nelas para a sua formação doutrinária;
- promovem discussão sobre temas atuais: educação, ambientalismo, pacifismo, etc;
- estimulam seus adeptos ao contato direto com o sagrado, objetivando sanar seus problemas; grande adesão de mulheres e pouca distinção de clero e laicato;
- ressaltam o pensamento positivo que transcende a matéria (cura pela fé) e apropriam-se do culto aos antepassados de forma reelaborada;
- liderança com formação eclética que incorpora elementos de outras origens (psicanálise, ciência cristã);
- presença de um líder carismático e/ou xamânico considerado pelos adeptos como divindade e possuidor de poderes místicos, cuja vida é utilizada como modelo a ser seguido pelos fiéis;
- a sucessão do líder ocorre, geralmente, em caráter hereditário ou semi-hereditário.
A maioria dessas novas religiões japonesas, das quais somente a Tenrikyô e a Oomoto foram fundadas por mulheres, iniciou suas atividades em pequenos grupos com reuniões em casas para aconselhamento. Esse é um aspecto importante e quebra um forte paradigma na cultura patriarcal nipônica, visto que não cabem as mulheres uma posição de liderança. Enfim as inovações são significativas e o caráter pragmático e moderno das Novas Religiões vão atrair milhares de japoneses dentro e foram do país. No próximo texto vamos conhecer um pouco destas duas primeiras religiões surgidas e como elas propiciarão a criação de muitas outras.