A Magia permeia todo o imaginário popular, não se detendo dentro de um só círculo, mas permeando todas as religiões, cultos e práticas. Mesmo aquelas religiões que insistem em dizer que não possuem rituais ou magia, acabam fazendo rituais mágicos. Muito dessa negação se dá pela própria falta de profundidade ao analisar o que é magia e o porquê rituais são magias.

O que precisamos entender é que a magia foi marginalizada no decorrer da história, mesmo antes quando ocupava um espaço claro e definido como centro da cultura de um povo, por meio de figuras como a parteira, a erveira e o sacerdote – vejam como era no antigo Egito, na Babilônia e em outras culturas antigas – que eram ao mesmo tempo conexões do povo com o divino e também representantes da magia desses Deuses.

Com o advento da cultura judaico-cristã, principalmente do cristianismo romano, institucionalizado, muito se perdeu da origem, chegando a gerar vários contratempos e até mesmo contradições. Hoje acreditamos em lendas de bruxas queimadas – geralmente mulheres – como se isso fosse praxe e não houvesse qualquer tipo de treinamento, mas segundo os pesquisadores isso é mais lenda. Havia sim um tribunal, que muitas vezes não era tão justo, porém os inquisidores eram preparados para ter candura, compreenderem que tanto homem e mulher faziam práticas mágicas e deviam analisar as práticas, se eram magia natural – não aceita completamente, mas tolerada, pois era praticada para o benefício da população – ou se era algum tipo de magia demoníaca – essas sim, julgadas com mais fervor.

Apesar de definirmos isso como a Idade das Trevas para os praticantes de magia, devemos também compreender que figuras como Tomás de Torquemada instauraram seu terror já no final dessa chamada era. Em 1500 viria a revolução renascentista e um resgate ao conhecimento do passado seria procurado, inclusive o conhecimento mágico.

Porém, o medo acabou sendo incutido na mente dos não-praticantes de magia, ao mesmo tempo que os praticantes procuravam se esconder cada vez mais, para não sofrerem com os julgamentos. O que pode-se dizer é que as fogueiras e julgamentos não foram para os bruxos, mas para qualquer ser humano que fizesse algo que o vizinho não gostasse, mas nem todos eram realmente mortos, a minoria acabava morta, mas o mito perdurou. Para saber mais sobre isso, eu indico o curso online (gratuito) Magic in the Middle Ages, da Universidade de Barcelona (em inglês).

O conhecimento mágico então ficou restrito a círculos fechados, que criaram os rituais iniciáticos para dar uma sensação de pertença a um seleto grupo e também servirem de controle para os ingressos, uma garantia de que os traidores seriam claramente identificados. Como diz o filósofo Lao Tsé

“Mantenha seus amigos perto, mas mantenha seus inimigos mais perto ainda.”

De qualquer forma, esse tipo de estrutura perdurou, porém muito do conhecimento mágico – que antes era aberto a comunidade de certa forma – se tornou privativo, em mãos de poucos ou nas mãos de alguns despreparados, que usam justamente da visão “fechada” da sociedade oculta para impedir uma avaliação de outros. Mas o que mais foi prejudicado foi o sentimento livre e de ser livre que a magia implicava.

Magia pode ou não ter conotação religiosa, mas em nenhum momento a magia é limitadora. O limite para as práticas mágicas são estabelecidos pela própria consciência do praticante de magia. Falando dessa forma parece-nos que é muito abrangente e que gera uma sensação de TUDO PODE dentro da magia. Se eu quiser prejudicar alguém, eu prejudico e pronto, sem mais considerações. Essa é uma interpretação errada dos lemas repetidos exaustivamente por adolescentes que tem problema com literatura e interpretação de texto, assim como outros mais velhos, que se acham muito bons naquilo que fazem. Frases como as de Aleister Crowley no livro da Lei:

“Faz o que tu queres, pois há de ser o todo da lei”.

Também confundem muito as coisas, implicando o lema caoísta (ChaosMagick):

“Nada é verdadeiro, tudo é permitido.”

Um lema na verdade proferido por Hassan ibn al-Sabbah, conhecido como O Velho da Montanha e líder da Ordem dos Hashishins ou Hashashins, um substantivo que hoje em dia podemos traduzir como Assassinos.

Essas máximas não querem dizer para você realmente fazer “o que lhe der na telha, que não vai pegar nada contigo, mermão”. Essas máximas dizem que não há limites para se fazer, pois as verdades são individuais e mutáveis, constantemente giram no grande relógio da vida e se tornam novamente dignas de uma reinterpretação. O mesmo erro ocorre quando julgamos civilizações mais antigas pela nossa ótica atual, levando sempre a crer que os mais antigos eram menos aptos ou inteligentes, que eram “amebas funcionais”, porém se esquecem que as ciências naturais como filosofia, matemática e química, por exemplo, começaram com esses “inaptos” e ainda mais, sem uso de tecnologia, calculadoras  e computadores.

O que devemos ter sempre em mente é que realmente tudo nos é permitido fazer, porém nem tudo é necessário ou convém. Nisso vemos a frase de São Paulo,

“Tudo me é permitido, mas nem tudo convém. Tudo me é permitido, mas eu não deixarei que nada domine.” 1 Coríntios 6:12

Paulo de Tarso, não quer dizer exatamente aqui – de forma não-isenta, pois ele era cristão – que você pode fazer o que quiser. Ele diz exatamente que você pode fazer qualquer coisa, mas que isso nem sempre é o melhor ou mais conveniente, pois tudo tem fluxo e refluxo. Ainda podemos extrair desse texto que ele pode fazer tudo, que será permitido, ou seja DEUS não irá interferir. Isso realça o poder dado ao livre-arbítrio e renova a aliança de Deus para com os homens de permitir que suas vidas sejam livres, sem que haja interferência não desejada. Mas também nos deixa um alerta claro, de que quando fazemos as coisas sem medir consequências ou pensar nas repercussões, elas nos dominam. Paulo diz que não deixaria que elas o dominassem.

Na magia da mesma forma, podemos fazer o que quiser, desde que estejamos preparados para as repercussões. Há uma necessidade de perpetrar um conjuro que eticamente pode ser questionável? Pode ser que haja sim. Mas devo eu fazê-lo? Se eu fizer serei punido? Pois bem, punição não é a palavra correta, é apenas o recebimento da onda de choque em sentido inverso, por ter movimentado forças, com as quais não estamos acostumados, graças a culpa cristã.

Devido ao medo do pecado, do erro e da punição eterna, deixamos várias pessoas nos fazerem mal e não fazemos nada para pará-las, sempre usando do discurso da “abnegação” e também do “karma” ou lei de causa e efeito. Oras, ninguém está no planeta para sofrer. Os sofrimentos que vivenciamos é apenas um reflexo de alguma prática que fizemos, mas isso foi feito as cegas, não havia a consciência? Pois, quando se tem consciência as trevas internas se abrandam. Quando abraçamos nossas sombras, paramos de alimentá-la e logo entramos em paz com nosso EU.

“Não há despertar de consciências sem dor. As pessoas farão de tudo, chegando aos limites do absurdo para evitar enfrentar a sua própria alma. Ninguém se torna iluminado por imaginar figuras de luz, mas sim por tornar consciente a escuridão.”

Carl Jung

Muitos de nós deixamos de praticar magia por medo, muitos de nós deixamos de praticar magia, pois colocamos todo nosso arcabouço mental a frente, prático e intelectualizado e esquecemos de SENTIR a magia. Muitos criam barreiras, pois o que querem da magia é apenas os benefícios, sem os refluxos. Quem dirá receber o retorno energético do que se pediu para outra pessoa. Por isso a prática mágica é exigente e não é para todos. Na verdade ficamos com medo de fazer alguma besteira que nos leve a danação eterna. Para esses eu digo: “RELAXA!”. Todos nós vamos para um tipo de inferno diferente (Umbral, Hel, Hades, Kalunga, Purgatório, etc…). Mas se você se torna consciente de seus atos, sabendo que tudo gera algo, positivo ou negativo e que só depende da gente saber lidar com isso, a magia será uma aliada para você.

Pois bem, principalmente aos umbandistas que se proferem magos supremos do arco-íris a todo momento, dizendo que não praticam nada negativo ou antiético, até mesmo amoral, mas se esquecem que seus pretos-velhos mandingueiros como só eles, muitas vezes quebram velas ao meio e ainda dizem que vão “pegar” alguns “kiumbas” a força. Estranho isso sair da boca de um preto-velho? De jeito nenhum… Eles sabem muito bem que às vezes é necessário acessar o pilar da severidade.

Espero que esse texto dê o que pensar a todos que tem medo das práticas mágicas. A magia é como tudo na vida, é como a família, como o trabalho e como o prazer. Temos momentos bons e ruins, algumas vezes temos as melhores intenções, mas no fundo os piores resultados e outras vezes caímos em completo desespero e ao invés de dominar uma inteligência externa, somos dominados por elas. Mas de qualquer forma, praticar magia é um exercício de libertação. Quanto mais livre nos tornamos, menos as trevas incomodam.

“Cede-me quando digo que estou no Pai e que o Pai está em mim; crede-o, ao menos por causa das mesmas obras. Em verdade, em verdade vos asseguro que aquele que crê em mim fará também as obras que Eu faço e outras maiores fará, pois eu vou para o meu Pai. E assim, seja o que for que vós pedirdes em meu Nome, isso Eu farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho.” – João 14:11-13.

Traduzindo as palavras do Cristo:

Deus está dentro de mim e eu estou dentro de Deus. Deus é o TODO e o TODO abarca realmente TUDO, seja positivo e negativo. Mas como o TODO é equilíbrio, eu por habitar e ser o TODO também sou equilibrado. Quando isso ocorre, podemos fazer magia (milagres), modificando nossa realidade, pois se DEUS tudo pode, eu como PARTE de DEUS, também o posso, pois os adjetivos de DEUS não são indivisíveis, o infinito mesmo dividido, continua a ser infinito. Podemos fazer obras ainda maiores, e sempre que pedires isso em nome de DEUS ou de JESUS, ou seja uma força direcionadora, ele assim o FARÁ (aqui não se diz que só fará coisas pedidas para o bem, mas sim “seja o que for que vós pedirdes”), ele fará para glorificar o nome do Pai por meio de seu filho, ou seja, do operador mágico.

Espero ter ajudado a expandir um pouco mais os limites da religião. Lembrando que a religião é castradora por motivos óbvios: Nem todos ainda estão preparados para serem livres! Vimos isso no Projeto Humaitá e vemos isso em diversas ordens por aí. Vamos continuar a ver, pois como Crowley disse:

“Os escravos hão de servir.” AL II 58

O problema aqui é que o escravo e o escravocrata são a mesma figura, ou seja, nós mesmos.

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