O Ocidente é marcado pela crença na figura mitológica de um salvador chamada por Jesus Cristo que é o ícone da maior religião do Planeta. Centenas de milhares de pessoas se reúnem às vésperas de 24 de dezembro para celebrar o nascimento do Nazareno que veio ao mundo há mais de 2000 anos anunciando a proposta de um Novo Mundo.

Desde então outros personagens sugiram com a mesma promessa, trazendo uma mensagem de amor e paz, repleta de esperança e alento para as mazelas da vida. Certamente que houveram outros personagens, antes de Cristo, que propagaram mensagens significativas para a humanidade, no entanto muitas de suas histórias se perderam no tempo. Os babilônicos, egípcios, os seguidores de zoroastrismo e principalmente os judeus tinham a peculiar crença no surgimento de um salvador que seria reconhecido como “Messias”(mashiah – ungido), ou seja, aquele que seria o “escolhido” por Deus.

É certo que permeia sobre as pessoas um sentimento de esperança, que pode ter mais que um significado imediato. Esperança então pode significar expectativa, esperar ou aguardar, mas esperança pode também expressar “ter fé” que dias melhores virão, pois, a situação atual é caótica e as vezes desesperadora. De acordo com o dicionário da Língua Portuguesa (Porto Editora), a palavra esperança significa “uma virtude teologal que inclina a vontade a confiar na bondade e omnipotência divinas, e a espera na vida eterna pelos méritos de Cristo”.

Se é certo que um salvador virá, o que fazemos então enquanto esperamos? Essa me parece uma questão intrigante visto que a espera é uma escolha e a maioria das pessoas prefere geralmente aguardar na inércia, se agrupando em religiões, que por meio de sua doutrina e ritos, propõe soluções momentâneas e imediatas.

Na teologia Cristã a escatologia, ou doutrina das últimas coisas, é o estudo que se debruça basicamente na esperança e fé. A figura do Cristo que retorna envolto em glória para construção de um reino universal alimenta a esperança dos seguidores que se encontram oprimidos pelo mal e uma miséria sem fim. Segundo o teólogo alemão Jürgen Moltmann no livro Teologia da Esperança “A esperança cristã é uma esperança de ressurreição e demonstra sua verdade pela contradição entre o presente e o futuro por ela visualizado. Futuro de justiça contra o pecado, de vida contra a morte, de glória contra o sofrimento, de paz contra a divisão” (pg. 33).

Ainda na perspectiva da teologia cristã, a esperança é “companheira inseparável” da fé e os cristãos são constantemente lembrados de que devem acreditar na vinda do salvador esperando pacientemente, mantendo-se livres do pecado, da soberba e da desesperança que são contrários à fé. Cabe ao cristão não se conformar com o mundo atual, mantendo-se obediente aos mandatos registrados no texto bíblico, aguardando que as profecias se cumpram. Mas enquanto se espera, o que cabe ao cristão fazer?

Há um outro aspecto sobre a figura do salvador que não compete unicamente ao campo das religiões, mas está associada à esfera social, principalmente, e que antecede sua vinda. Se precisamos de um salvador “da pátria”, é porque vivemos em desordem numa sociedade corrompida e sobre a qual não temos poder para agir. De acordo com os estudos da Sociologia da Religião, em especial as contribuições do alemão Max Weber e do francês Henri Desroche, a vinda de um salvador é precedida de momentos conturbados, de caos e insegurança. Sendo assim, poderíamos indagar: Se ansiamos por alguém que conduza a sociedade no caminho correto seria pelo fato de não estarmos fazendo a nossa parte?

E quanto a pergunta principal que originou esse texto: porque precisamos de um salvador? Seria talvez porque somos incapazes de encontrar respostas e soluções para problemas criados pela sociedade na qual estamos inseridos? Ou porque somos incapazes de assumir os erros e enganos cometidos por nós próprios e, portanto, precisamos de alguém que assuma?

Na perspectiva de Desroche, o período que antecede a vinda do salvador, chamado de “gestação do messias”, seria marcado por uma desesperança na figura humana e um anseio alucinado por uma intervenção divina. Vivemos numa sociedade desintegrada de valores humanos que são sobrepostos por valores capitalistas, vivendo uma falsa religiosidade em megatemplos onde se entra e sai sem ao menos conhecer o “irmão” que está ao seu lado. Ou então encontramos religiões que propõe uma comunhão virtual com indivíduos impulsionados por interesses próprios em busca de sua autossatisfação.

A esperança é o sonho de um homem em vigília, segundo Desroche, e esse sonho do indivíduo acordado é a religião, que sustenta a espera. Não seria ela então, a religião, a responsável por nos manter firmes e fortes, íntegros e lúcidos a fim de buscarmos nossas próprias respostas e conquistas? Talvez Karl Marx tenha razão ao afirmar que a religião é um produto humano, uma alienação na medida que transferimos para o outro algo que nos pertence, o domínio sobre nossa vida.

A vida humana não pode ser marcada por um constante ir e vir sem sentido, ela deve ter a forma e o movimento que eu atribuo. Está na hora do ser humano ser protagonista de sua própria vida, e deixar de viver suas relações na superficialidade a espera de um salvador.

 

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