Por Peterson Danda

 

Durante alguns anos temos acompanhado um grande debate que cativa defensores e polariza grupos de pessoas em diversas partes do mundo, com defensores famosos e fervorosos em ambos os lados, e você também certamente já ouviu falar sobre o Aquecimento Global.

 Dentre os que estudam a causa, existem diversas teorias que justificam o aumento da temperatura dos oceanos e superfície da terra, a maioria delas, colocando nós “Terrículas” (tomando emprestado um termo muito usado por Ramatis), como os principais causadores destas “mazelas” ao nosso globo.

Meu intuito aqui não é entrar no cerne da questão, muito menos apontar responsáveis, mas a algum tempo, e principalmente com o avanço nos estudos espiritualistas, há um ponto que vem habitando minha mente com relação a esse assunto: Qual o papel das religiões e da espiritualidade neste processo?

 

Provavelmente agora você deve estar pensando qual a relação entre religião e aquecimento global, mas deixe-me expor alguns fatos.

 A espiritualidade e a religiosidade estão presentes em nós desde o início dos tempos, e seu vínculo com a magia e com a natureza data de antes do tempo que conhecemos. Desde que nos tornamos bípedes, ampliamos nossas possibilidades de analisar o ambiente que nos cerca e perceber o Divino que nele habita, pois o homem primitivo já acreditava nesta magia e reconhecia a Divindade presente na natureza ao seu redor.

Se avançarmos na história, veremos essa conexão entre religiosidade, espiritualidade e natureza repetir-se diversas vezes. Os cultos pagãos pré-cristãos identificavam suas divindades na natureza, como a Deusa Mãe Terra, e tinham nos ciclos de estações seus principais rituais de agradecimento e pedidos. Os indígenas também projetavam no Sol, na Lua e nas Matas suas principais divindades e as oferendavam e cultuavam respeitando seus ciclos e aprendendo com eles como viver em harmonia. Essas adoração à natureza vai se repetir na Índia, nos povos Andinos, Nórdicos, Celtas, na África e por diversos povos antigos.

 Mas afinal de contas, se a religiosidade sempre foi vinculada a natureza e estamos em um processo de degradação dela, onde essa conexão foi rompida?

 Em grande parte, na propagação em massa do Cristianismo, em especial, do Catolicismo.

 Enquanto os povos Pagãos tinham como prática os cultos as divindades relacionadas à natureza, às estações do ano e tinha a Mãe Natureza como sua grande provedora, o Cristianismo foi estruturado no culto a um Deus único, que “habita o céu” e tem na terra seu filho único, Jesus Cristo, como seu principal representante. Com essa prática centralizadora, a ICAR (Igreja Católica Apostólica Romana), no intuito de converter os Pagãos ao seu culto monoteísta, acabou por absorver e distorcer boa parte das divindades e práticas desses povos, transformando-as em Santos Humanos e suas festas de culto à natureza em homenagens a esses “homens de Deus”.

Com uma divindade maior centralizada em um Ser Supremo habitante dos céus e com suas festividades de louvor e agradecimento convertidas em festas de culto a homens santos, a natureza deixou de ser, para o homem moderno, o habitat de suas divindades, que agora ocupam apenas nosso imaginário e nossa Fé. Seus templos não são mais os rios e as matas, mas catedrais de pedra construídas por mãos humanas.

Se aliarmos essa “humanização” das divindades com a corrupção e distorção de valores que nossa sociedade vive, não há porque não esgotar a natureza em prol de “avanços tecnológicos” e do nosso enriquecimento, não é verdade? Para o homem urbano, cada vez mais a natureza é um sinônimo de férias e lazer, ou no máximo uma fonte de fornecimento dos nossos alimentos.

 Mas ainda é possível ao homem moderno praticar o culto à natureza ou essa religiosidade se perdeu com os indígenas e pagãos dizimados na era das grandes conquistas?

Felizmente sim. Ainda existem, mesmo que em minorias perseguidas e desacreditadas, algumas correntes Pagãs e Xamanistas, além de vertentes herdeiras destes cultos antigos à natureza, como por exemplo, a Umbanda e o Candomblé no Brasil.

 Nelas, Deus (ou Olorum/Zambi/Tupã) é força Criadora e Mantenedora de tudo que existe, inclusive de nós, e tem nos Orixás suas “divindades gerentes”, responsáveis cada um pela manutenção e administração de um aspecto específico da natureza, tanto o habitat natural quando a natureza do Ser Humano.

 Nestes cultos a natureza não só pode como deve ser preservada e oferendada, pois nela estão os Pontos de Força que nos aproximam de Deus, nos sintonizando com as divindades que neles habitam (os Orixás), auxiliando na potencialização de nossas qualidades e lapidação de nossos defeitos. Um adepto de Umbanda ou do Candomblé é, acima de tudo, um defensor e amante da natureza, pois nela habitam suas divindades e nela estão suas conexões diretas com o Criador Maior.

 Como disse o próprio Papa Bento XVI, “o homem é um ser religioso por essência”. Não seria então unindo novamente a Fé e a Religiosidade com a Natureza uma das principais formas de preserva-la?

UPDATE:
Este texto foi escrito e publicado originalmente há pelo menos 2 anos, então achei pertinente sugerir algumas correções e adendos, principalmente à partir do comentário da leitora Vivien.
Quando afirmamos que a responsabilidade da deturpação dos cultos a natureza se dá principalmente após a propagação do Cristianismo, estamos apenas o utilizando como referência por ser a religião patriarcal com maior número de adeptos, mas realmente ela não é a única. Todas as religiões que centram-se em um único Deus Onisciente e Onipresente acaba por incorrer neste mesmo distanciamento.
Não se trata apenas do culto voltado a um templo, mas sim, da mudança de foco, dado que nos cultos antigos as divindades eram a própria natureza e esta que era adorada, e não uma força externa criadora. Mesmo que a natureza seja criação de Deus, o homem moderno não se sente zelador desta, pois não mais reconhece a sua dependência nela, agregando a isto diversos outros fatores não religiosos (industrialização em massa, urbanização e etc…).
Com relação a poluição causada pelas práticas ritualísticas dos cultos de matriz africana (Umbanda, Candomblé…), nos pontos de força, realmente há uma falta de consciência ambiental por parte de alguns praticantes, algo bastante compreensível, já que a religião nem sempre molda a moral humana.
Hoje temos diversas formas de realizar estes rituais utilizando apenas de materiais biodegradáveis, e recolhendo aquilo da natureza aquilo que não for necessário ficar lá por um tempo superior a realização deste, bem como, a todo o lixo extra produzido pela permanência das pessoas lá. Porém, infelizmente, ainda existem algumas práticas incoerentes sendo realizadas por pessoas que não param para analisar a teoria versus a prática daquilo que cultua.
Cabe aqui a lição de que os generalismos são falhos e, assim como há Umbandistas e Candomblecistas que não se importam com a natureza da forma como deveriam, há também Cristãos compreendem a natureza como Mãe.

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